“Eu sei falar uma língua que só o meu cachorro,
o prezado Ulisses, meu caro senhor, entende.
É assim: dacoleba, tutiban, ziticoba, letuban [...]
Isso quer dizer uma coisa que nem o imperador da China entenderia?”.
Clarice Lispector em Um Sopro de Vida
obra: mário nunes
olhei de soslaio ao longo da ruae vi uma sombra em movimento
acocorado
como se, se arrastasse furtivamente
carregando o peso da existência
se assemelhava a um homem
mas era um cão
um bicho-cão
andando pela rua vazia
cheia de silêncios
e da minha curiosidade na sacada
o bicho-cão seguia
como se fosse o dono da rua
como se fosse o dono de tudo
como se fosse o dono do mundo
farejava a vida com curiosidade
demarcava sua territorialidade
urinando nos postes
na calçada
e no meio-fio
em seu focinho
trazia a história da humanidade
o acúmulo das descobertas
as dúvidas
e a liberdade
e vi a poesia no cão
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Olinda, XXVI - III - MMXX
Lester Young, Prisoner of Love
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Olinda, XXVI - III - MMXX
Lester Young, Prisoner of Love
O olhar do poeta faz toda a diferença...
ResponderExcluirMagnífico poema, gostei imenso.
Continuação de boa semana.
Abraço.
Obrigada, bom final de semana!
ExcluirAbraço.
Existem animais que são de uma fidelidade ao dono incrível. O cão, será talvez., o maior exemplo disso.
ResponderExcluirAgora não tenho porque moro num apartamento. Desde criança até à idade adulta morei em casas com quintal. Sempre tive gatos e cães.
O gato não. Mas o cão é capaz de dar a sua vida para salvar a do dono. Haverá pessoa que faça isso poir alguém? Se calhar nem pelo pai ou mãe.
Fique feliz
Se calhar... Os animais nos ensinam muito, se estivermos dispostos a aprender.
ExcluirAbraço.
:)
Olhar e perceber faz toda a diferença. Daí o instante mágico no olhar poético sobre o cão. Intenso poema!
ResponderExcluirAbraços,
Obrigada, José Carlos Sant Anna, como se sabe "a realidade só não basta", muitos de nós precisamos de um pouco de poesia, que a encontramos até num instante em que se percebe o cão.
ExcluirAbraço e bom final de semana.
:)
Tempos difíceis em que o silêncio e o medo tomaram conta de nós e das ruas onde desembocam as nossas casas...mas a esperança ainda mora num cantinho do nosso peito.
ResponderExcluirUm abraço.
Ainda bem, que não desesperançamos!
ExcluirUm abraço, bom final de semana.
:)
"...carregando o peso da existência...)
ResponderExcluirDevidamente contextualizado, este parece mesmo um mundo cão. Mas o "parece" abre uma pequena janela de... :)
Fique bem, Canto.
Um beijinho :)
Algumas vezes a existência pesa... Mas ao nos depararmos com a alegria e a amizade dos cães, a pequena "janela de" se abre para o "parece".
ExcluirMuito bem pontuado por si, obrigada.
Cuida-te bem, beijinho e ótimo final de semana.
:)
"Cão como nós", diria o Manuel Alegre
ResponderExcluirabraço
Pois sim, o Manuel Alegre sabe o que diz e sabe dizer muito bem.
ExcluirMuitas vezes somos como um "Cão que não querias
ser cão", diante de uma vida-cão.
Abraço, bom final de semana.
:)
como eu entendo essa poesia nos olhos do cão...
ResponderExcluire digo o que diz o Manuel Veiga "Cão como nós" terno livro de Manuel Alegre.
beijinhos
:)
Quem tem sensibilidade sabe bem.
ExcluirPois, "Cão como nós".
Beijinhos.
:)