quarta-feira, 26 de junho de 2013

aquela dose de veneno

"Remeta-me os dedos
em vez de cartas de amor
[...]
Repito:
Se meta na minha vida
outra vez meta
Remeta".

cortesã - ismael nery

quero aquela cotidiana dose
de veneno
escarlate como vinho tinto
vermelho como sangue
doce como a vingança

aquela dose quente, carmim
que escorre - víbora -
disfarçada, malemolente
macia e rápida pelo canto da boca
e se aloja à espreita

ávida
certeira do bote
da vítima
do beijo
porque hoje eu te quero

meu desejo estrangulado
peçonha
alucinado
diante do mundo disfarçado
no peito guardado

mas para ti anunciado


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Olinda - XIX - VI - MMXIII

george michael, careless whisper...


sábado, 22 de junho de 2013

nunca mais

"E tudo que era efêmero
Se desfez.
E ficaste só tu, que és eterno"... 

imagem: wassily kandinsky

ele gostava do kandinsky
ela do vermelho
ele era do samba
ela vivia no jazz

a vida para ele era um passo de dança
ela delirava com as nota musicais
para ele a vida era uma festa
ela planejava o mundo

entre todos os azuis
se perderam
a festa daquele encontro
acabou no malice

e nunca mais se viram
e nunca mais o riso
e nunca mais feliz
e nunca mais azul
 
e nunca mais kandimsky
e nunca mais vermelho
e nunca mais o samba
e nunca mais o jazz

a vida virou nunca mais
nunca mais
nunca
mais.

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E o belo filigrana que vamos tecendo, e vai se ornando de belezas como essa que a Piedade fez, reparem:


Ele admirava a arte da Paula Rego
ela delirava com o iman maleki
ele gostava dos Muse
ela ouvia Caetano e toda a música brasileira.

Ele era apaixonado pela música em sua vida
e ela dançava descalça em frente do espelho
imaginando-o enlaçado nela
ambos a conquistar o mundo sem medos.

Entre cores translúcidas de cinza e verde
e ela impregnada nos azuis
se encontram entre os cheiros
dos escritos numa Feira de Livros

E nunca mais se isolaram
nunca mais se questionaram
nunca mais a vida foi a mesma
nunca mais a imaginação cessou

E nunca mais ela dançou
e ele cantou
e o sorriso ficou
e o imprevisto não finou.

E nunca mais a vida se levou
nunca mais
nunca mais
nunca nunca.
Mais.



Olinda - XIV - VI - MMXIII

maria gadu canta, do chico e do edu lobo, a história de lily braun

segunda-feira, 17 de junho de 2013

vazio

"Num barco sem vela aberta
Nesse mar
Nesse mar sem rumo certo
Longe de ti
Ou bem perto"...


vazio é o espaço que se estabelece
entre o tempo e a vontade
entre a escassez e a saudade
entre o grito de dor e a liberdade

vazio é a amplidão do olhar
que persevera em mergulhar além
explodindo milhões de partículas  no ar
e se esconde entre as nuvens e o mar 

vazio é aquela canção
que a rádio insiste em tocar
naquela hora mais inesperada
que ecoa aferrenhada no coração

vazio é a angústia em cada esquina
é o adeus acenado
é a fome de manhã
é a falta de pão

vazio é quando anoitece
e a alma aturdida esmorece
já não sabe mais sonhar
que um dia o tempo se esquece

que entre a nostalgia e a solidão
entre o barco e a ilusão
existe uma espera que aquece
um cais que amanhece

um aperto de mão
um sol para iluminar
ouro de mina guardado
e um porto para atracar!


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Eu adoro a intertextualidade que o Filipe nos proporciona, é de uma gentileza sem  tamanho:

O vazio é um espaço vago
(aparentemente)

Contudo,
todo o vazio é precedido
de inúmeros outros espaços
(antecedentes)

Outros espaços complexos e inquietantes
preenchidos na dor, na angustia,
na melancolia, na desilusão...

Na etérea canção do tempo que passa
e nos compõe memória
e nos forma em destituição

Digo,
De vago o vazio pouco tem
Todo o vazio é intensamente denso

Talvez porque
"vazio é o espaço que se estabelece
entre o tempo e a vontade"

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E o Benno, com sua força poética e sua pena certeira, cujas poesias redundam emoção, explosões e espetaculares harmonias, nos traz:


o vazio é o hiato
que separa nossas bocas
o vazio é o que fica
depois que elas se separam
o vazio é o antídoto
do veneno que o beijo inocula
ah! eu sem este vazio
seria eu mesmo, ou seria outro?
pleno é só o encontro


outros vazios compõem
a farta flora do nada

a terra seca
o lago morto
o lamento
a cabeça que não pensa
o coração que não sente
a ausência
e a saudade infinita

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Reparem que belo fio de Ariadne, fomos tecendo, cada um com seu estilo, desta feita é a beleza do poema da  Piedade, apreciem, por favor!

Vazio

Vazio é o sentir
entre a dor e a saudade
e esta lágrima que cai
obstinada e sem identidade

Vazio é o olhar entre as colinas
e sentir que o sonho se esvai
que explode em cinza e pó
nos caminhos por onde se distrai

Vazio é aquele poema
que tu nunca cantaste
olvidado ficou no tempo e
no fundo das tuas memórias

Vazio é o frio das esquinas
é o fim anunciado
é a incerteza que amedronta
é talvez o nosso fado

Vazio é a noite e seus espectros
é o medo que se aloja
e se assola até nos ossos
e nos leva até o prazer de sonhar

Ma sé preciso reagir ao vazio
e então resistiremos
semeando flores
em todos os sorrisos

E as estrelas nascerão em cada olhar
e em cada rosto e em cada boca
uma palavra de esperança
ainda se cantará

num hino que entoaremos em uníssono
num dia em que existirá um cais
e um porto à nossa espera
numa ilha desconhecida
.

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Olinda - XIV - VI - MMXII


luther ingram canta, if lovin you is wrong i don't wanna be right

terça-feira, 11 de junho de 2013

o essencial

- Ve y mira nuevamente las rosas. 
Comprenderás que la tuya es única en el mundo [...]
Es muy simple: no se ve bien sino con el corazón.
 Lo esencial es invisible a los ojos.
Antoine de Saint-Exupéry in El Principito. pp. 70,72


 imagem: marc chagall


o essencial não aprisiona
não se discute
não se revela
apenas existe

o essencial se mantém
em equilíbrio
entre o poema e a flor
entre a vertigem e o esplendor

não vive na sombra
nem  explode na luz
não quer notoriedade
apenas existe

muitas vezes é silêncio
ocasionalmente é loquaz
não se circunscreve
no âmbito da vaidade

o essencial não representa
não carece de palco
desconhece platéia
apenas existe

o essencial não precisa de respostas
porque não faz perguntas
não é medroso
sua coragem está na fé

não se entristece
porque se embevece com o mar
têm o azul em suas retinas
não condena e nem liberta

apenas existe!

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E o Filipe - um poeta desmedido, que vale a pena ler - sempre preciso, responde numa sintonia poética e reflexiva:

Da essência
o verso existencial
Da perenidade
o espaço essencial

Como inscrever no verso o tempo que nos move ?

"o essencial não aprisiona
não se discute
não se revela
apenas existe"

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Olinda - X - VI - MMXIII


miles davis (minha grande paixão jazzista), a silent way

sábado, 8 de junho de 2013

quiro mantéia


"No entanto, o intemporal em vós sabe
 da intemporalidade da vida.
 E sabe que ontem é apenas a memória de hoje
 e o amanhã é o sonho de hoje."
Khalil Gibran in O Profeta. p.80-81

  imagem: ismael nery

"a estrada é longa"...
assim disse a cigana que leu a minha mão
existem muitos desejos, sonhos e alucinações
em cada traçado
curvo ou entrecortado

obscuro ou sinalizado
seja na linha  da vida, da cabeça -  da razão
mas quem decidirá sou eu
esse é o destino

senhora das (próprias) decisões
porque os montes
a direção e os ventos
mudam com o tempo

a arte advinhatória também
no intricado mapa
impresso na palma, estão as indicações
anunciando a quem interessar possa

que o futuro não existe
é coisa de profeta
nem vidência alucinatória
nem a saudade, nem a dor, nem a solidão

só o gosto daquele beijo
- e uma forte intuição - 
e aquela linha reta
aquela que é chave

para se entender o coração

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E  o Filipe (quem, senão ele) grande e querido poeta, retraça minhas tortuosas linhas assim:

 Talvez a crença num destino
(autónomo e incontrolável)
seja apenas flagrante fraqueza
(uma pretexto de conformada inércia)

Assim o diz a razão (assim o digo também)


Mas
que dizer dos sinais (que vejo)
que dizer dos obscuros ventos (que sinto)
como definir os caminhos em verso (que escrevo)

Como entender todas as impossibilidades que o tempo tem?

(divagações de um pseudo-poeta
que "na utopia se diz profeta")

O futuro não existe enquanto não se faz passado

Só o beijo
E o verso

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Olinda - VIII - VI - MMXIII


rita lee canta, menino bonito  (escute o piano é demais de lindo!)



segunda-feira, 3 de junho de 2013

se eu tiver que voltar


"I hope the exit is joyeful
                                                                                                             and hope never tu return".
Frida Kahlo
imagem: frida kahlo


eu vivo como se tudo fosse verdade:
da mais simples a mais sofisticada mentira
da mais doce a  mais temível realidade

trato meus inimigos com respeito
e meus amigos com carinho e doçura
acredito em todos e desconfio de tudo

tenho muitas dúvidas
e nenhuma certeza
se haverá juízo final, não sei

mas ajo para que diante do metafísico
minha pena seja leve como a liberdade
para não ter que retornar

e se essa tragédia acontecer
quero voltar outra vez eu
para poder lhe reenca(o)nt(r)ar...

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Porque o Filipe olha além-mar, além-palavras, e vê  os sentimentos que pul(s)am:


Se tudo fosse verdade
E a metafísica relativa
Se o verso fosse saída
E a memória relatividade

O tempo voltaria
Como memória de uma imprevista idade


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E a Piedade, toda sensibilida, traz a sua bela intertextualidade:

eu sinto a verdade, mas prefiro acreditar na mentira,
porque sei que a verdade esconde,
a agrura dos momentos conturbados.

meus inimigos não sabem e eu para me sentir bem
sinto que são todos amigos
porque não acredito neles mas muito mais em mim.

assaltam-me receios terríveis
duvidas insondáveis e disfarçadas
nos abismos que se estendem sem fim.

mas se algo acontecer eu aceito,
e de braços abertos vou no voo,
para no mesmo voo regressar.


Olinda - I - VI - MMXIII

caetano veloso & lila downs cantam burn it blue (do filme frida, com salma hayek e alfred molina)

b17

Os cães não ladraram  os anjos adormeceram  a lua se escondeu. Dina Salústio em   Apanhar é ruim demais imagem colhida na internet, d...