sábado, 27 de julho de 2013

"dia da partida"

"Mal nos conhecemos
Inauguramos a palavra «amigo».
[...]
Um olhar bem limpo,
Uma casa, mesmo modesta, que se oferece,
[...]
É a verdade partilhada, praticada"...
Alexandre O´Neill in Amigo, Poesias Completas. p 79

quando tudo se vai e a noite escura recai
manto negro
no vagar dos dias que virão

quando tudo é desolação
e os acontecimentos insolúveis
são por si a solução

quando tudo é entorpecimento
e a vida se esvai cumprindo o ritual
daquela passagem entre a terra e o firmamento

quando tudo foi plantado
no amor, na esperança e na fé
e o imponderável muda de nome

resta a espera, a sabedoria e a paciência
para saber que o outro tempo indelével
é chamado de eternidade!

-----

E o Filipe, sempre atento, e atenciosamente poético, diz:

O mistério de Ser permanece por desvendar (dizem)
Contudo, toda a profecia se escreve em verso
Como palavra-cifra a decifrar

"quando tudo é desolação
os acontecimentos insolúveis
são por si a solução"

Talvez o destino seja um espaço-tempo circular

Ou como escrevi uma vez,

«A eternidade é incertamente certa
Uma forma de promessa
Uma alterância inversa
Em controversa alteração»

------

Olinda -  XXVII - VII - MMXII

Os encontros são (talvez) o que de melhor pode nos proporcionar a vida, seja no âmbito familiar, dos amores e da amizade, toda vivência que não seja baseada em uma dessas três dimensões, torna-se efêmera. Tenho amigos que são mais valiosos que todos os tesouros do mundo.

António Zambujo, Foi Deus


domingo, 14 de julho de 2013

um eu

"[...] no encanto do crepúsculo metropolitano,
 sentia-me perseguido pela solidão e 
pressentia que o mesmo se passava com os outros[...]"
F. Scott Fitzgerald in The Great Gatsby. p. 63

imagem: emíliano di cavalcanti

nesse preciso momento
em que existes
- ainda que eu hesite -
precioso em sentido e sentimento

trago os olhos carregados de estrelas
pés recobertos de nuvens
não existe na boca
nenhum travo de saudade

ou um:

eu-solidão
eu-desolação
eu-a-sós
somente nós

sou
bandeira desfraldada
entregue ao sentimento
tu - eterno -
em mim
presente nessa essência
que não tem fim

------

Um dos privilégios de se ter um amigo poeta, com a grandeza do Filipe Campos Melo é ser mimada com  poesias da sua lavra, reparem nessa beleza:

O "Eu" é inato sortilégio
que só é pleno no "Outro"

"eu-solidão
eu-desolação
eu-a-sós
somente nós"

Eis o fundamento de todas as infindas demandas
a razão de todos os circulares caminhos

Eis o verso-Nós


------

recife - IX - IV - MMXII

madeleine peyroux, j'ai deux amours




sexta-feira, 5 de julho de 2013

a vida é um grão

"Como queres que eu não pergunte se tudo se faz pergunta"?
Hilda Hilst in Kadosh. p.51

imagem - emil nolde

a vida é um grão
algo tão inexplicável como a morte
tão inesperada como um corte
tão imprevisível como uma partida de pôquer

tão instável como a sorte
que pode ou não brotar
que pode ou não ser uma alegria
mas espere a dor
 
isso é real
como os dias que seguem
como a música que escutas
como a passagem terrena e a poesia

real como a fome de todo dia
a turbulência nos céus dos aviões
como o silêncio quando dormes
como a ausência quando despertas

como as sete notas do pentagrama
como o voo dos pássaros
como o estremecimento de medo
como a dolência depois do alcool

como a dormência
do esquecimento
como a indiferença do desamor
como a faísca  que apaga
 
como a saudade
que dói
deixa tudo no silêncio
e outra vez explode o grão da vida!


-----------

E o Filipe Campos Melo, esse grande poeta que explode sensibilidade:

Inesperado
Imprevisível
Instável

O medo
O murro
As horas escassas

O mundo
Tanto

------

E o Benno, poeta de marca maior, onde a sensibilidade aflora:

a vida não e só grão mas também gota
que volátil evapora instantânea ao solo quente
voa lentamente encorpa então a nuvem escura
e cai na terra em queda a chuva mansa novamente

e este ciclo se renova e se repete infindas vezes
e tanto insiste até que um dia o acaso faz o improvável
a gota em solo aterrisa inusitada bem na mira
e grão e gota se juntam numa mesma fonte renovável

-------

Olinda - XXIII - VI - MMXIII


Otto, Pra ser só minha mulher



segunda-feira, 1 de julho de 2013

da minha escrita

Ninguém é capaz de prever o que possa vir a fazer 
uma pessoa que sofre dos males do desamor.



Escrevo para não ser estrangulada pelos acontecimentos diários. Não é uma fuga, mas uma maneira de me libertar das amarguras e angústias cotidianas. Escrever pode ser o real, o inverossímil - ou não - daquele instante,  é concreto porque perpetua os sentimentos em palavras. E depois de escritos, criam asas, vida própria, interpretações múltiplas; inverossímil, a ficção pode ser apenas na escrita. Mas são sentidos, sofridos, vividos, percebidos por outrem, de uma maneira muito particular; e podem vir a ter um cariz irreal, ou a face exata da emoção pontual de cada um que toma ciência dessa escrita, naquele momento. Porque passa pela identificação, é a voz que grita o que estava silencioso no peito, ou a mão que escreve o que estava guardado e derramou naquele texto.
Quando damos vazão ao mundaréu de emoções que nos revolvem por dentro, exteriorizando-os cá fora, deixando-os escritos e aprisionados no papel (ou no espaço virtual), parecem perder a dimensão que lhes havíamos dado, e aquela força que movia montanhas, se perde no vácuo. Escrever é uma maneira de nos reorganizarmos internamente, é o encaixe do puzzle, é uma forma de manter a sanidade mental; é uma tentativa de ressignificar a nossa existência. É a virada de página, a passagem para um amanhã que talvez nem chegue, dependendo do nível emocional, do equilíbrio ou da loucura de cada um.
Mas para que tanto drama com um amanhã que ainda nem aconteceu? E nem sabemos se acontecerá... E só está escrito aqui?

----------------

*A tela está na horizontal, a original é na vertical, mas escolhi publicá-la assim.

Olinda - IV - I - MMXII

Amor Electro - A Máquina

b17

Os cães não ladraram  os anjos adormeceram  a lua se escondeu. Dina Salústio em   Apanhar é ruim demais imagem colhida na internet, d...