domingo, 29 de março de 2009

O Meu "Porto Sentido".

Cordoaria

Mesmo sabendo o trajeto, os percursos eram sempre desconhecidos e cheios de surpresas. Vislumbrei situações efêmeras, corriqueiras, banais, comuns, normais; mas carregados com um quê de inesgotáveis. Tudo é e era cercado, e carregado de maravilhamentos, os sentidos todos alertas para o mundo que me circundava e me fascinava. Desde sempre gostei de sentar num canto, num banco, numa praça e observar o ir, vir e devires dos transeuntes, no Porto, não foi e nem haveria de ser diferente. Situações e histórias imagináveis, sempre acompanharam o meu olhar, quando se amplia rumo aos caminhantes, um olhar inauferidor, desvestido de julgamentos, mas cheio de imaginação, com ramificações e bifurcações que traçados, se confundiam com o plano da cidade... O Porto!

Rotunda da Boa Vista

O Porto oculto, invisível, escondido, negado, e não apenas camuflado, quando envolto na bruma densa e fria que o extingue e o guarda dos olhares mais óbvios, e que timidamente evita apresentar-se; o que se esconde na escuridão invernal. O Porto subterrâneo, a cidade que está sob a cidade, que se desdobra nos degraus da escadaria da praça da Arca D´Água, o mundo úmido, lugúbre e escuro, que corta-a, toda, por baixo... E corta junto a alma das gentes portuenses, que vivem à margem do Porto, como miragens que se arrastam nos labirintos dela, e deles. Que sequer conseguem captar a superfície, o inexaurível das pessoas e das coisas.
O rio que se derrama por baixo, desde a Rotunda da Boa Vista, rasga a rua de Campo Alegre e deságua no Douro.


Casas e varais na Ribeira

Mas existe também o Porto desoculto, visível, exposto, ensolarado e claro; com flores coloridas nas janelas, jardins e quintais; que se mostra aos olhos de quem o quiser ver. O Porto mágico, que desfila a beleza das casas antigas (ainda que decadentes), e os incontáveis varais com roupas estendidas, como bandeiras que tremulam num convite à paz, da Ribeira à Liberdade; da Foz ao cais.


No Mercado do Bolhão

O Porto cosmopolita na simplicidade do Bolhão; o Porto e a Trindade; nas casas comerciais da Via Santa Catarina;


Jardins do Palácio de Cristal

o Porto do Palácio de Cristal (e o Museu Romântico da Quinta da Macieirinha); do Museu de Serralves; do Vinho do Porto; a Casa do Infante; de Soares dos Reis; o Castelo do Queijo;


Torre dos Clérigos

da imponente, altiva e símbolo da cidade, a Torre dos Clérigos; o Porto de todos os caminhos, que se encontram e se separam... O Porto Medieval, pedaços de muralhas que cercavam a cidade;

Cavaleiro Templário
a estátua do Cavaleiro Templário, na lateral da Igreja da Sé... O estádio do Dragão, do azul e branco do Futebol Clube do Porto... E a Casa da Música, que tantas vezes acompanhou meus passos, e (des)compassos na melodia dos meus sonhos, no tamborilar dos meus dedos; e no cadenciado ritmo das minhas pernas compridas e o balanceado das minhas cadeiras... Além das construções sacras, como a deslumbrante Igreja de São Francisco...
Uma das caves do Porto

E o vinho e o Douro, ah! O Douro! Há o Rio Douro, que sempre me conferiu cumplicidade e lealdade, quando eu o margeava solenemente, em meu silente e religioso silêncio, quando o peito rasgado, pelas saudades de casa, o Douro recebia as lágrimas profusas que brotavam doridas dos meus olhos miúdos (mas grandes nos descobrimentos e deslumbramentos).
O Porto dos olhares desavisados e do desvario inusitado, quando a vista se descortina do lado de lá de Vila Nova de Gaia, e nos confere a mais bela e extasiante paisagem da cidade, as casas azulejadas e empoleiradas da Ribeira e o sol resplandecente nas águas do rio, engolindo a nossa íris;

O Douro, as pipas e a Ponte Dom Luís
o eléctrico que corta a Cordoaria, sobe pela Batalha e desce por Miragaia;
Eléctrico
Não vou contar do Porto e das histórias de lutas e glórias; das revoluções e tensões; não quero falar do que já é conhecido; não quero contar da grandeza do Porto, hoje eu canto a minha saudade dessa cidade, que me acolheu de braços abertos e me deu belezas, amores, amigos e canções. Da vida que flui e se transforma incessantemente, no meu pequeno mundo; o que está dentro e fora de mim; o Porto da minha Universidade; Porto, minha cidade. Do meu povo no Porto que morro de saudades!
Meu Porto querido, quantas revelações, quantas construções, nessa minha pequenina declaração de amor, rogo uma prece em teu louvor: aonde quer que eu vá, te carregarei e celebrarei. E como Dom Pedro V, vosso; I, nosso, deixo-te para a imemória (do que nunca será esquecido), meu coração, esse músculo, vermelho, pulsante que bate retumbante no compasso da minha saudade.

E transcrevo a frase da Amália Rodrigues, quando fala do Fado: "é tudo o que sei, mais o que eu não sei dizer". Assim é minha paixão pelo Porto.
E dentre tantas canções, a que embala tantos sentires, não podia ser outra que não:

Porto Sentido (Rui Veloso e Carlos Tê),

"Quem te vê ao vir da ponte/és cascata, são-joanina/dirigida sobre um monte/ no meio da neblina./ Por ruelas
e calçadas/da Ribeira até à Foz/por pedras sujas e gastas/e lampiões tristes e sós./E esse teu ar grave e sério/dum rosto e cantaria /que nos oculta o mistério/dessa luz bela e sombria/Ver-te assim abandonada/nesse timbre pardacento/nesse teu jeito fechado/de quem mói um sentimento/E é sempre a primeira vez/em cada regresso a casa/rever-te nessa altivez/de milhafre ferido na asa"

http://www.youtube.com/watch?v=OK0S4mYj1X0



Tarragona (Espanha), março de 2009













b17

Os cães não ladraram  os anjos adormeceram  a lua se escondeu. Dina Salústio em   Apanhar é ruim demais imagem colhida na internet, d...