quinta-feira, 18 de março de 2021

o poeta tem a urgência da vida

"Uma palavra morre
Quando é dita
Dir-se-ia
Pois eu digo
Que ela nasce
Nesse dia".

Emily Dickinson em Poemas. p. 113

rené  magritte in the human condition, 1933


o trinco, a porta o prego, o pão

podem esperar, mas o poeta não

o poeta tem a urgência da vida

que pulsa em cada poema que explode no papel


o telefone quebrado

o pneu a ser trocado

aquela janela emperrada

que insiste na triste melodia indelicada de um não-madrigal


numa cantilena noturna

dobrando notas enferrujadas como as dobradiças atravancadas 

que não sustentam mais o peso da madeira 

do carvalho envelhecido


que já dão sinais de cansaço

de meta cumprida

tempo vencido

e que (não) alimentam o poeta


porque para o bardo o real infunde

a dor é matéria

a tristeza é o tempero

e a solidão a autopoiesis cobiçada


ah, poetas que se despem

nas palavras

e se deixam enlinhar 

letra a letra sacrificando todas as almas que têm 


quando nasce uma poesia

morre a inspiração do poeta, todavia.

--

Olinda, XVIII - III - MMXX

Lenine, É simples assim

5 comentários:

  1. O branco da página precede a criação, e a palavra o vazio a preencher a sombra a iluminar instaurando um mundo novo, tal como concebido neste poema.
    Um abraço,

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  2. Bem vistas as coisas, pouco importa o que o poeta sente, mas sim aquilo que transmite. Aí, sim, as palavras ganham nova vida sob a batuta de quem as lê. Porque tudo se pode transcender à luz de quem cogita, nos desenhos de quem, por impulso, arquitecta.

    Um beijinho, Canto :)

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    Respostas
    1. "O poeta é um fingidor"... Impossível não recuperar o poema, Psicografia.
      É interessante também saber o que o leitor leu, viu, sentiu...

      Um beijinho, AC.

      :)

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  3. quando nasce uma poesia

    morre a inspiração do poeta, todavia.

    eu direi!

    quando nasce uma poesia

    o poeta renasce para outra a seguir

    gostei bastante do poema

    beijinhos

    :)

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